por Seyla Benhabib
(2011)
I.Os Ventos da Guerra – Por Quem Eles Sopram?
Em 1922, Carl Schmitt publicou “Teologia Política: Quatro Capítulos sobre o Conceito de Soberania”[1]. Republicado em 1934 com um novo prefácio de Schmitt, este texto, junto a “O Conceito do Político” (1932) e “Crise da Democracia Parlamentar” (1923)[2], estabeleceu Schmitt como um dos principais críticos do projeto democrático liberal. Schmitt documentou não apenas a transformação sociológica do parlamentarismo liberal no governo de grupos e comitês de interesses especiais que eventualmente solapavam os parlamentos de funcionarem como corpos deliberativos. Ele também apontou as falácias racionalistas do liberalismo até seus “conceitos-limite” – die Grenzbegriffe – serem descobertos. Estes conceitos-limite, na perspectiva de Schmitt, constituíam as bases secretas e impensadas sobre as quais a estrutura do Estado moderno se apoiava. A soberania é um desses conceitos-limite; governo por discussão, e a pressuposição de que todas as opiniões eventualmente convergirão através da deliberação até um resultado racional, estão entre as outras pressuposições inquestionadas do liberalismo.
As críticas sociológicas e filosóficas de Schmitt se provaram formidáveis e inspiraram pensadores da direita e da esquerda. De Otto Kirchheimer e Walter Benjamin a Hans Morgenthau e Leo Strauss, até Chantal Mouffe e Ernesto Laclau[3], bem como muitos outros em nossos tempos, Schmitt é a éminence grise a quem nos voltamos quando o projeto liberal-democrático está em crise. Não há necessidade aqui de documentar o extenso renascimento schmittiano que floresceu na Europa e nos Estados Unidos nas últimas décadas. Ao invés disso, eu gostaria de relembrar brevemente algumas teses da “Teologia Política” de Schmitt para poder demarcar as continuidades e as descontinuidades entre preocupações contemporâneas que podem ser reunidas sob a “teologia política” e as próprias preocupações de Schmitt.